sexta-feira, maio 04, 2007

Sobre risos e rugas

Eu estava feliz e minhas amigas foram tão brochantes com minhas novidades que isso me deprimiu. Não apenas porque me senti muito só na minha felicidade, mas porque me invadiu uma profunda preocupação com elas, e eu já não consegui mais deixar de imaginá-las fazendo sexo com aquela mesma cara sem graça, de cu sem dono. Mania minha de achar que tesão é estado de espírito e que transcende quartos, paredes, camas e amantes. Nos meus dias de muito tesão na vida, me envergonho de conversar com homens, receio que eles me achem interessante demais, sem que essa seja minha intenção. Então, tento me enfeiar de alguma forma, pra me concentrar no que estou sentindo e querendo transmitir, porque não se pode confundir, e aí me recuso a ser sensual. Tenho certas vaidades, mas também me dou o direito de vestir roupa larga, calcinha grande, fazer coque no cabelo e prender com lápis, usar óculos, chinelo com meia.

Um cara era apaixonado por mim, e um dia eu vivi um lance tão bacana que fiquei com muita vontade de compartilhar e, por acaso, ele foi a primeira pessoa que encontrei. Então, tava eu lá, em alfa, contando o que havia acontecido, e quando dei por mim vi que ele me ouvia com uma cara de bobo, os coraçõezinhos pulavam da cabeça, e eu perguntei por que ele me olhava daquele jeito, e ele suspirou e me disse que era maravilhoso me ouvir. Estragou tudo. O cara não tava nem aí pro que eu falava, e isso me preocupou seriamente porque um dia serei uma velha pelancuda, então acho que ninguém mais vai me ouvir. Mas ali ele me ouvia. Não pelo que eu dizia propriamente, pois naquele momento eu tive como certo o fato de que se eu peidasse ele interpretaria como poesia gaseificada.

Ah, preciso ser honesta: nesse dias em que tenho tesão em tudo, em ver, em cheiros, a verdade é que eu mesma sinto vontade de me comer. A que ponto chego... Dia desses a Lu me disse: “Amiga, você se arreganha tanto pra vida que um dia o cosmo vai te foder”.

Mas sou fascinante apenas e enquanto preservo meu muro e mantenho meu espaço. Se eu abrir a guarda, afugento. Sempre foi assim e não acuso ninguém. Para tal pecado não há condenação. Porque quando eu me abro é feito baú com um monte de brinquedo guardado: cai uma avalanche de novidade esquecida, no início é aquela felicidade, mas depois vem a frustração de não saber o que fazer com tanta diversão esparramada. Sinto que as pessoas têm uma enorme dificuldade de brincar comigo e não as julgo por isso. Minha exaltação é castigo. Pra me prevenir de mim, resolvi cortar o meu rabo e ficar cotó, assim não corro o risco de, na primeira emoção infantil, eu sair me abanando feliz por aí.

Tenho uma crença irritante de me considerar predestinada à missão de tornar este mundo melhor, me julgo responsável por salpicar o Universo de beleza, e daí entro numa de querer espalhar sorrisos e compartilhar minha felicidade, só que isso não existe. Quando estou extremamente feliz e divido isso com os amigos, eles fazem cara de peido – que pra mim não é poesia gaseificada – e eu então fico ainda mais radiante, num esforço de ser mais óbvia, quase dizendo, “porra, eu tô feliz! Fique também, por favor!”. E aí eu começo a ficar muito cansada de me exaltar, e minha felicidade se transforma numa grande fraqueza, porque minhas energias se esvaem nessa de tanto pular de alegria. E porque gasto minha energia em tentativas saltitantes, em estados de alegria eu fico muito vulnerável a qualquer tristeza.

Rir demais marca a expressão. Dá ruga tanto quanto chorar. Todo mundo faz careta quando a gargalhada é forte que nem choro. Mas expressão de Monalisa é sempre obra-prima, e porque não diz algo propriamente, é aí que a gente fica em paz, apenas tentando decifrar o que sente quando vê, e essa tentativa já é o sentir tomando conta.

Depois de passar algumas horas com meus amigos, as sensações podem ser duas, extremo cansaço ou paz, e agora me vem a constatação que empiricamente eu já provara: quando falo muito, discuto, me exalto, sou feliz, me bate em seguida uma angústia que é essa tal falta de energia. Mas nas vezes em que apenas ouço, presto atenção nas discussões sobre o mundo, mas não participo delas, porque na verdade ninguém se ouve mais, quando minha postura é mais recolhida, aí então consigo me manter mais suave e sempre saio com a leveza de quem contribuiu da melhor forma.

Chega de tanto estardalhaço. Só preciso entender que meu espaço pra explosão é escrever, e ninguém é obrigado a ler, e eu me torno mais leve assim. Simples.

3 comentários:

Cláudia Lamego disse...

Hoje eu queria escrever, para extravasar o que de muito estranho há em mim. Você está certa. Não precisa escrever para ser a melhor, apenas escrever para ser.

Beijo

A digestora metanóica disse...

escreva, querida. escreva.
beijo

माया disse...

Senti falta das suas digestões, digo, digressões. Por estranha coincidência, caminhamos em rumos iguais, estradas paralelas, conclusões semelhantes. Espero que a febre tenha arrefecido de vez e o inverno seja-lhe manso, como são os momentos de silêncio em meio a perturbações.