quinta-feira, agosto 30, 2007

Conto do prazer em ré

Volto no tempo, dois anos antes, quando nos conhecemos. Amigos em comum, interesses mesmos e vem a empatia fácil. Descamba para admiração. Ok, nada demais. A linha de segurança é forte. Sem tesão não há solução. De minha parte não há tesão, logo tudo está prévia e irremediavelmente solucionado. Porque não existe perigo, nem penso em me proteger. A serpente sequer dá-se ao trabalho de chegar em silêncio. Ao contrário, faz música com seu chiado. E, porque gosto de ouvir, aproveita e vem se enroscando. E porque gosto de sentir, já não a afasto mais.

Ela já faz parte de mim, embora eu recuse os frutos que vez e outra me oferece. Com sua alma de serpente, ela sabe que qualquer dia provo do caminho do pecado, então apenas espera, pacientemente, o tempo preciso.

Chega por fim o momento da sedução, do degustar o fruto, da consciência da nudez num paraíso que já não há. Com olhos que vêem o Bem e o Mal, escolho o Pior. Deus se cala e apenas chora, daquele jeito dolorido de quem paga o preço de confiar na humanidade e conceder-lhe liberdade.

E então, o agora. Ergo-me. Já é chegada a hora da redenção e vida eterna não se concede a quem rasteja. Sigo com fé porque o torpor de todo veneno um dia se extingue.

Conto do prazer em ré

Volto no tempo, dois anos antes, quando nos conhecemos. Amigos em comum, interesses mesmos e vem a empatia fácil. Descamba para admiração. Ok, nada demais. A linha de segurança é forte. Sem tesão não há solução. De minha parte não há tesão, logo tudo está prévia e irremediavelmente solucionado. Porque não existe perigo, nem penso em me proteger. A serpente sequer dá-se ao trabalho de chegar em silêncio. Ao contrário, faz música com seu chiado. E, porque gosto de ouvir, aproveita e vem se enroscando. E porque gosto de sentir, já não a afasto mais.

Ela já faz parte de mim, embora eu recuse os frutos que vez e outra me oferece. Com sua alma de serpente, ela sabe que qualquer dia provo do caminho do pecado, então apenas espera, pacientemente, o tempo preciso.

Chega por fim o momento da sedução, do degustar o fruto, da consciência da nudez num paraíso que já não há. Com olhos que vêem o Bem e o Mal, escolho o Pior. Deus se cala e apenas chora, daquele jeito dolorido de quem paga o preço de confiar na humanidade e conceder-lhe liberdade.

E então, o agora. Ergo-me. Já é chegada a hora da redenção e vida eterna não se concede a quem rasteja. Sigo com fé porque o torpor de todo veneno um dia se extingue.

quarta-feira, agosto 29, 2007

Das primaveras aos 26

Faz alguns dias, por conta do meu aniversário que vinha chegando (e chegou ontem), lembrei que há dois anos planejei escrever um texto sobre o significado da data pra mim.

Aos 24 anos, tive vontade de escrever sobre o que me fazia não gostar de aniversários. Pensei em falar do meu aborrecimento com organização de festa pra mim mesma, em ter que dizer para as pessoas que faço questão da presença delas quando na verdade entendo que todos têm suas urgências, em fazer as pessoas saírem de casa em dia de semana. E tinha também a implicância com bolos, parabéns e celular tocando o dia inteiro. Desejei confessar a minha total inabilidade em reunir grupos diferentes e meu incômodo de me saber um elo desajustado entre eles. Quis muito externar o quanto achava sem sentido comprar roupas e sapatos novos para a data especial, porque depois eles não serviriam para os outros dias da minha vida que, de modo geral, é feita de jornadas extraordinariamente comuns.

Ontem, aos 26 anos, eu continuava achando o mesmo. Ainda assim, mandei e-mail pros chegados e marquei encontro de última hora no bar que mais gosto, em plena terça-feira chuvosa. Liguei pra confirmar algumas queridas presenças. Recebi com alegria todos os parabéns e fiquei feliz porque o celular tocou irritantemente o dia inteiro.

Comprei um sapato novo que ficará lindo com as minhas calças jeans. Usei um vestido da Beca, que adora me fazer experimentar suas roupas e brincar de me maquiar. Ela sempre me dizia que queria um dia fazer eu ficar poderosa. E conseguiu. A Pri chegou e saímos de casa, eu quase borrando os olhos de emoção, de tão bonita que fiquei depois dos cuidados da Beca, de seus cremes, maquiagens e perfumes. Pensei que esse negócio de ser gostada faz mesmo a gente se sentir com poderes especiais.

No bar, amigos de faculdade, do trabalho, da dança, da vizinhança. Amigos dos amigos, namorados das amigas, namoradas dos amigos, mais aquela gente que simplesmente encontrei pela vida. Dorien, Nique, João, Rê, Ed, Léo, Clarice, Diogo, Geraldine, Gus, Magoo, Di, Dê, Beto, Roblis, Tante...

Eu, totalmente inábil para reunir grupos diferentes, pulei de mesa em mesa, falei besteira, apresentei todo mundo pra todo mundo, contando sempre um caso, dizendo por que cada um ali era especial. Bebi uns drinks com tequila e fiz ainda mais jus ao meu posto de elo desajustado (e feliz!) entre eles.

Só faltou o bolo, mas aí também já seria demais...

terça-feira, agosto 21, 2007

Dos acúmulos



Quanto mofo nesta virtualidade. Não por meu descuido ou falta de vontade, que fique claro. Ah... me gosto mais quando escrevo. Pessoas me redescobrem ao me ler, aconteceu diversas vezes. Os comentários eu coleciono na memória, mas um destaco agora: “Gi, você escrevendo é clara e serena” (bem diferente da versão 3D, é o que posso intuir). Outro bem oportuno, de alguém então muito, muito presente na minha vida: “li seus textos e me dei conta de que nunca te ouvi”. E aquele do amigo há 14 anos: “que pretensão alguém achar que te conhece”.

Sim, se trata de um retorno “umbiguista” feito outros, porque de novo me acumulei demais. “Orai e vigiai sem cessar”, dizia São Paulo. “Use Cepacol diariamente e visite seu dentista regularmente”. Tudo, tudo nessa vida segue a lógica da manutenção. Não posso me acumular, eu sei e sei. Escrever sempre, ainda não aprendi? Essa mania de engolir tudo pra vomitar de uma vez.. De novo a sutileza de existir num mundo físico em que todo corpo tende ao repouso, mas o tempo não pára.

A ordem do dia é entender melhor as conseqüências de meus passos. Quase sempre me parece fácil sair correndo, me sobra fôlego e energia para disparar, e até aí nada de errado. De repente me canso, e me vejo de novo sozinha. Ontem me senti assim, e aí lembrei de um post-desabafo, de dezembro de 2005, de título “marido sem lágrimas”, autoria da Helô, mulher que se sabe mulher, poderosa e eficiente. Transcrevo abaixo:

"vontade de chorar, mas cadê as lágrimas?
assim como no samba, queria desabafar o que sinto no peito e não posso dizer. ok, posso escrever.
quero um marido cuidando de mim."


Até ontem esse era o tipo de confissão de me provocar calafrios. Pura afetação de balzaquianas inconsoláveis que não descobriram como se amar e se completar. Ok, eu me amo, me sinto completa e ontem me descobri uma balzaquiana inconsolável – e afetada.

No melhor estilo mulher almodovariana, cabelos presos no alto da cabeça, blusa e unhas vermelhas, ontem borrei a maquiagem dos olhos porque eu quero um marido cuidando de mim.