sexta-feira, fevereiro 23, 2007

Do cio de existir

A pequena morte
“Não nos provoca riso o amor quando chega ao mais profundo de sua viagem, ao mais alto de seu vôo: no mais profundo, no mais alto, nos arranca gemidos e suspiros, vozes de dor, embora seja dor jubilosa, e pensando bem não há nada de estranho nisso, porque nascer é uma alegria que dói. Pequena Morte, chamam na França a culminação do abraço, que ao quebrar-nos faz por nos encontrar e acabando conosco nos principia. Pequena Morte, dizem; mas grande, muito grande haverá de ser, se ao nos matar nos nasce”. (Eduardo Galeano)


Nascer é uma alegria que dói. Remédio bom tem gosto ruim. Pra eletrizar é preciso muito atrito. Sexo bom faz cansar. Todo corpo tende ao repouso, mas a gente sempre se levanta. “Viver é muito perigoso”, diz compadre meu Riobaldo.

Às vezes acho que dei adeus demais. Mudei de escola sete vezes, já abandonei uma faculdade, sou filha de pais separados, não conheci os avós paternos, não lembro do avô materno. A única avó com quem pouco convivi era amarga demais pra me mimar e morreu de câncer quando eu tinha nove anos. Chorei de amor pela primeira vez aos 11, passei adolescência longe de mãe, morei no Oriente Médio, viajei por oito países, perdi irmã, sobrinho e melhor amiga pro Velho Continente. Mais de uma vez tive dois trabalhos, sempre ganhei mal, fiquei quatro anos sem férias e só descansei desempregada. Golpe de vida meu peito sempre agüenta.

Já dei exemplos do princípio da realidade dinâmica. Por causa dessa lei, deixei contos por terminar, amores ficaram pelo caminho, amizades pela metade. Eu me forço ao repouso, mas tudo ao redor se movimenta. 2007 ainda é fevereiro e já tive salário atrasado, cumpri um aviso prévio, comecei no meu novo emprego, tive quatro paixões espirituais platônicas, comprei três pares de sapato, fiz duas viagens, me relacionei de lampejo no plano físico com quatro caras – e nem era Carnaval. Conheci muita, muita gente bacana.

Eu morreria tranqüila, mas tenho muitas dívidas. Voltei pra dança e continuo na ioga, consegui meu certificado do IELTS, tenho ido ao cinema com freqüência e cuidado dos meus amigos. Quero montar uma bandinha de rock pra ser vocalista, fazer mestrado, aprender francês e holandês, escrever um livro.

Deus, me dê mais de uma existência.

8 comentários:

Shishiiiiiiiiiiiiiiiiia disse...

Sera que essa ansiedade por fazer coisas estah no ar esses dias? Tambem to assim tem uns dias, querendo tb mais de uma existencia, ou talvez uma existencia mais longa, com dias interminaveis onde sempre dah tempo para fazer tudo que vc planejar. mas geralmente vou dormir com pendencias...e assim eh todo mundo...mas a ansia de realizar mais tem me rondado a cabeca, mas tb a duvida de outro filho ( o que nao combina com ter tempo extra para vc...). sei lah...soh algumas divagacoes...mas eu to assim esses dias...

shishiiiiiiiia disse...

Acabei esquecendo de comentar ...que vida movimentada a sua heim ermachusca ? Mas parabens por todas as conquistas e por todos os planos que sei serao conquistas!bjs teamuuuuuuu

Confligerante disse...

bah, tchê! assim se falaria por aqui.
Bah, digo eu daqui.
João

Luciana Gondim disse...

Amiga, amém pela sua falta de pudor em ficar tão nua! Falei com Teresa que não me canso de me surpreender com você, que não duvidaria nada se te encontrasse sem roupa no centro da cidade. A menina me respondeu que ficar nua na rua é coisa de Dolores, e não de Gisele. Que Gisele já transcendeu isso, e fica nua de espírito, o que é muito mais difícil e louvável. Então tá, né?

Qualhada disse...

Magnífico!
Aliás, a magnificencia é a tônica dos seus escritos. Antes, eu só conhecia o Djavan com essa capacidade de botar poesia e profundidade em idéias simples e com palavras simples.
Vai que é tua, Gisele!
Abraço do Qualhada

Inseparabilidade disse...

passei aqui com saudade e ela aumentou mais ainda.
amo muito vc, minha linda.

Adriana disse...

Ateh que enfim se animou a voltar a escrever... hehehehe
Beijos!
Adri

Katerina Volcov disse...

olha...eu não te conheço..mas gostei do seu "repente nao mais que de repente" sobre a existência... principalmente "tiro férias quando estou desempregada"..eu também sou eu dessa mesma legião... um abraço e boa sorte... katerina volcov